13 dezembro 2010

Nem-sei-o-que-hei-de-chamar-a-isto ou a "suavidade" da imprensa portuguesa

Segundo os Americanos, temos uma primeiro-ministro telegénico e (esta achega é minha) umas eleições presidenciais a serem disputadas entre o Alegrosaurius e um Cavaco apartidário (esta é de rebolar a rir).
Além disso, este último fez birra por não ter sido recebido pelo Bush e como retaliação mandou retirar parte do contingente no Afeganistão.
Cavaco diz ainda que a imprensa portuguesa é muito suave, suavezinha como o português que nunca o foi e já não o é (pois, estou a fumar um vermelho).
E daqui é que vem o meu grande espanto, não pelo que o senhor disse, mas porque até hoje consideraria improvável alguma vez poder estar de acordo com ele. Sim, também eu tenho uma costela vingativa que reclama todas as bastonadas no pelo por ele ordenadas.
Finalmente - e misturando mesmo tudo num único post - pergunto-me como é que o BCP, tendo cometido uma traição de tão alto nível junto de um parceiro tão relevante como o Irão, será digno da confiança dos seus clientes da "arraia-miúda"...
Também eu sou a wikileaks!

26 outubro 2010

Inquietação

A contas com o bem que tu me fazes
A contas com o mal por que passei
Com tantas guerras que travei
Já não sei fazer as pazes
São flores aos milhões entre ruínas
Meu peito feito campo de batalha
Cada alvorada que me ensinas
Oiro em pó que o vento espalha
Cá dentro inquietação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda
Há sempre qualquer coisa que está pra acontecer
Qualquer coisa que eu devia perceber
Porquê, não sei
Porquê, não sei
Porquê, não sei ainda
Ensinas-me fazer tantas perguntas
Na volta das respostas que eu trazia
Quantas promessas eu faria
Se as cumprisse todas juntas
Não largues esta mão no torvelinho
Pois falta sempre pouco para chegar
Eu não meti o barco ao mar
Pra ficar pelo caminho
Cá dentro inqueitação, inquietação
É só inquietação, inquietação
Porquê, não sei
Mas sei
É que não sei ainda
Há sempre qualquer coisa que eu tenho que fazer
Qualquer coisa que eu devia resolver
Porquê, não sei
Mas sei
Que essa coisa é que é linda

(José Mário Branco)

21 outubro 2010

Direito à Preguiça

A alma adora nadar. Para nadar, há que deitar-se de barriga. A alma despega-se e parte. Parte a nadar. (Se a vossa alma parte quando estais de pé, ou sentados, ou de joelhos, ou apoiados nos cotovelos, para cada posição corporal diferente a alma partira com uma locomoção e uma forma diferentes, segundo concluirei mais tarde).
Fala-se muito em voar. Não é isso. O que ela faz é nadar. E nada com as serpentes e as enguias, nunca de outro modo. Há imensa gente que tem assim uma alma que adora nadar. Chamam-lhes vulgarmente preguiçosos. Quando a alma deixa o corpo pelo ventre para nadar, produz-se uma tal libertação de sei lá o quê, é um abandono, um gozo, uma descontracção tão íntima.
A alma parte a nadar no vão das escadas, ou na rua, consoante a timidez ou a audácia do homem, porque ela conserva sempre um fio que a une a ele, e se esse fio se quebrasse (às vezes é muito fino, mas só uma força terrível o poderia romper) seria terrível para eles (para ela e para ele).
Então, quando ela está entretida a nadar ao longe, escoam-se, por esse simples fio que liga o homem à alma, volumes de uma espécie de matéria espiritual, como lama, como mercúrio, ou como gás – gozo interminável.
É por isso que o preguiçoso é incorrigível. Nunca mudará. É por isso que a preguiça é a mãe de todos os vícios. Pois acaso haverá coisa mais egoísta do que a preguiça?
Tem fundamentos que o orgulho não tem.
Mas as pessoas irritam-se com os preguiçosos.
Quando os vêm deitados, batem-lhes, mandam-lhes água fria à cabeça, eles têm de recolher a alma imediatamente. Olham-vos então com esse olhar de ódio, bem conhecido, que se vê sobretudo nas crianças.

(Henri Michaux)

13 setembro 2010

A estrelinha do photomaton volta a brilhar


CARLOS MORGANHO

Fotografia
inauguração da exposição

Dia 16 de Setembro, quinta-feira
às 19H00

Arquivo Fotográfico
Rua da Palma, 246 (perto do Martin Moniz) - Lisboa

Exposição colectiva sobre a Mouraria
inserida no Festival "Todos"


É impossível resistir e não regressar. Neste bairro há algo que nos agarra e nos faz voltar, sempre com a sensação mágica que estamos a descobrir o mundo todo ao virar de cada esquina. Voltar dia após dia e caminhar pelas mesmas ruas, reencontrar caras conhecidas e descobrir novos amigos, os mesmos mas sempre novos... Sons, cores e cheiros.
A Mouraria tornou-se quase um vício - e fotografá-la também. Aos poucos torna-se natural, misturamo-nos, conversamos, convivemos e depois de tanto tempo já não somos "um-estranho-de-máquina-em-punho".
Por tudo isso, o maior desafio foi mesmo o de contar a história deste bairro, da sua gente. da sua vida e actividades - das procissões à mesquita, das ruas às casas onde nos recebem, das oficinas às tascas - em apenas dez fotografias. Como é que se faz caber aqui o mundo inteiro?


Carlos Morganho nasceu em 1969. Formou-se em Sociologia em 1993, com uma tese sobre as migrações internas em Portugal e desde então trabalhou na área da exibição cinematográfica.
Começou a dedicar-se à fotografia em 2005. Em 2007 exibe pela primeira vez o seu trabalho através da exposição individual “Que força é essa?” e em 2008 conclui o curso de fotojornalismo do CENJOR.
Em 2009 colabora com o Festival TODOS, através do projecto “Auto-retratos da Mouraria”, no Martim Moniz e da exposição colectiva “Todos”, no Arquivo Fotográfico de Lisboa.
Colabora com o jornal Rosa Maria, da Associação Renovar a Mouraria.
Este ano viajou pelos campos de refugiados do Sahara Ocidental, onde fez reportagem fotográfica que em breve pretende partilhar com o público numa exposição de cariz internacional (Portugal, Suíça, Alemanha e Brasil).

www.carlosmorganho.photoshelter.com
www.todoscaminhadadeculturas.blogspot.com

16 julho 2010

Importantes activistas detidos em Smara no Sahara Ocidental


Ontem à noite, dia 14 de Julho de 2010 as 21:00, foram detidos pela guarda nacional marroquínas e a policia marroquina dois importantes activistas saharauis dos direitos humanos, o Sr Sidi Mohamed Daddach, Presidente da CODAPSO e o Sr Sidahmed Lemjiyed, Presidente da CSPRON.
A detenção ocorreu na zona oeste da cidade de Smara (Sahara Ocidental Ocupado), quando ambos foram detidos pelo menos uma hora em cada posto de controle sendo revistados e intimidados. Após terem passado os postos de controle e tendo entrado na cidade de Smara, os vehículos aos serviços secretos de segurança de Marrocos perseguiram-nos. Os vehiculos rodearam a casa do activista saharaui de direitos humanos e Presidente do Comité de Smara. Eram dois automóveis de cor branca pertencentes a secção de informação geral.
Os dois activistas tinham como missão investigar a realidade dos direitos humanos na região de Smara, visitando activistas de direitos humanos da região, assim como visitar as familias dos presos politicos saharauis detidos em prisões marrroquinas.
Sidi Mohammed Daddach é um dos activistas dos direitos humanos saharauis mais destacado, tendo estado encarcerado mais de duas decadas no carceres negros marroquinos, sujeito a inumeras formas de torutura. Quando foi preso em 1979 foi condenado á pena de morte mas devido a pressão internacional a pena foi alterada para prisão perpetua. Em 1999 foi libertado após anos de acções e denúncias da Amnestia Internacional e de outras organizações de defesa dos direitos humanos, como por exemplo a AFAPREDESA. Em 2002 Daddach recebeu o prémio Rafto. Após grandes dificuldades para obter o passaporte conseguio deslocar-se à Noruega para receber o prémio, onde lhe foi possivel reencontrar-se com a sua mãe pela primeira vez desde 1975. A mãe de Daddach vive actualmente nos acampamentos de refugiados no sul da Argélia.
Sidi Daddach é constantmente alvo de acções repressivas e de intimidação por parte das autoridades marroquinas.
Em Abril de 2010 representantes do Conselho Português para a Paz e Cooperação tiveram um breve encontro com o Sr. Daddach nos acampamentos de refugiados durante uma visita de vários activistas aos acampamentos.

(Noticia publicada em www.saharatoday.net e traduzida por Isabel Lourenço)

18 junho 2010

Objecto Quase


Nunca antes tinha chorado a morte de alguém que não conheci. O que é estranho porque sempre me pareceu bizarro o comportamento das pessoas nestas situações (tipo o funeral da Amália).
Sinto-me profundamente de luto, não tanto por uma pessoa mas pela amargura de saber que as suas palavras acabaram, ponto final, fim. Não há mais.
De luto por um país que não o merece.
De luto por ter um Presidente cujo governo o censurou mas que – em tempo de campanha – deverá comparecer, pesaroso e condolente, nas cerimónias fúnebres que não serão na Jangada de Pedra mas na capital de um país improvável.
De luto por na televisão se vomitarem chorrilhos de disparates: de correcções gramaticais a salazaristas que o confessam com a mesma leviandade com que afirmam nunca terem lido uma única linha, passando por VIPs culturais que, ao telefone, devem estar a engolir todos os sapos, por a inveja não lhes ter deixado nem mais unha para roer.
De luto pelo salsero cubano que na rua, enquanto me convidava para uma aulita gingada, ao saber de onde vinha não exclamou “Luís Figo!”, nem “CR7!” mas SARAMAGO!!!
De luto por o avô de alguém que está sempre a sorrir… e hoje não está, não pode estar. E pelo meu também: tinha muito poucos livros, mas herdei um orgulhoso “Levantado do chão” que fazia questão de exibir na prateleira desempoeirada, ao lado da bola da felicidade.
De luto, acima de tudo por mim, por querer sempre mais mas “pedir não devo, dar não tenho”, por não ser politicamente convicta nem saber dançar com as palavras no baile de uma ideia boa. Pelo nunca mais de todos os dias…

08 abril 2010

Sahara II – Espera-esperança

Diz-se que “saber esperar é uma virtude”. Tretas! Há coisas que são urgentes, inadiáveis. Há coisas que se não acontecerem agora, pode ser tarde demais…
Quanto tempo se pode esperar por um país? Quanto tempo é possível cumprir um cessar-fogo unilateral enquanto se assiste ao delapidar das riquezas que o inimigo suga até ao tutano? Quanto tempo mais demorará esta luta em que cada gole de água ou pedaço de carne ou fruta consiste literalmente uma batalha? Quanto poderá durar um sonho vivido em terra estranha, principalmente para os mais jovens que nunca viram a sua?
Há certos tipos de espera e de esperança que só alguns têm o privilégio de saber alimentar à força de tanto, tanto acreditar. Para a gente Sahauri prefiro o ditado “quem espera sempre alcança”…

Sahara I - Terra

Há muito tempo o meu querido avô chamou-me para me contar um segredo: queria que eu soubesse que a maior riqueza do mundo não está no ouro, no dinheiro nem no petróleo. Para ele o bem maior era a terra. E disse-me isso, com toda a convicção, com um punhado dela espalhado na mão suja, como quem me transmitia uma herança real.
Claro que enquanto adolescente estouvada, na altura não percebi grande coisa e passaram muito anos sem que me lembrasse mais disto. Cresci sem me tornar grande patriota: amo a minha gente mas são mais as vezes que me envergonho do meu país…
Acontece que tive o privilégio de conhecer um povo que, sem saber nada desta minha história, me convidou a redescobrir nas entranhas este ensinamento do meu avô. Um povo que há mais de trinta anos se vê privado da sua terra que tanto ama, sem nunca perder a esperança de a ela regressar para construir um país azul. Um povo que sem ter nada cuida de cada um com a convicção de que todos serão necessários e determinantes para a concretização desse sonho. Um povo que se dispõe a correr sobre um campo minado de bandeira na mão, gritando “Sahara livre”, nas barbas de um inimigo covarde que se esconde atrás de um muro que todos nós, por cumplicidade, ajudamos todos os dias a engordar.
Depois de dez dias no deserto, quando atravessei a ponte que liga Ayamonte a Vila Real de Santo António e vi o estuário do rio, o mar ao fundo e o verde por todo o lado, finalmente percebi. Foram precisos trinta e três anos e a ajuda de um dos povos mais ricos do mundo. Foi preciso conhecer presidentes e ouvir torturados. Foi preciso comer pó e ter muita sede. Mas encardida até aos ossos, cansada de morte e com saudades de casa, finalmente percebi.

09 março 2010

Ecumenismo


A lua lá no céu
A neve na montanha
A música do grilo
O salto do macaco
A cor azul, a cor laranja
O peixe no rio
O olhar da criança
A brincadeira do dia e da noite
O revezar da lua com o sol
O sorriso que está no rosto
O trabalho, o ócio
O nascer do dia, o sol posto
As mil e uma estrelas
Que iluminam o caminho
A mente consciente
A linda donzela
Vestida de linho
Que quando passa tudo pára
A flor que sobressai
Nos campos verdejantes
O frio e o quente
A chuva que cai, cai
Nos campos verdejantes
Equilibra o ambiente
Tudo, tudo vem de Jah

25 fevereiro 2010

Help the aged

One time they were just like you, drinking, smoking…
And if you look very hard behind the lines upon their face you may see where you are headed and it's such a lonely place…Teach you stuff although he's looking rough.
In the meantime we try to forget that nothing lasts forever. No big deal so give us all a feel. Funny how it all falls away.
When did you first realise? You can dye your hair but it's the one thing you can't change: can't run away from yourself...

(a partir de "Help The Aged", Pulp)

21 fevereiro 2010

Eu sou a que no mundo anda perdida
Eu sou a que na vida não tem norte
Sou a irmã do sonho e desta sorte (…)
Sombra de névoa ténue e esvaecida
Sou aquela que passa e ninguém vê...
Sou a que chamam triste sem o ser...
Sou a que chora sem saber porquê...
Sou talvez a visão que alguém sonhou,
Alguém que veio ao mundo pra me ver,
E que nunca na vida me encontrou!

(Florbela Espanca)

Balada de um estranho

Hoje acordaste de uma forma diferente dos outros dias
sentes-te estranho tens as mãos húmidas e frias
tentas lembrar-te de algum pesadelo mas o esforço é em vão
parece-te ouvir passos dentro de casa mas não sabes de quem são
Deixas o quarto e vais a sala espreitar atrás do sofá
mas aí tu já suspeitas que os fantasmas não estão la
vais a janela e ao olhares pra fora sentes que perdeste o teu centro
e de repente descobres que chegou a hora de olhares para dentro
Vês o teu nome escrito num envelope que rasgas nervosamente
tu já tinhas lido essa carta antecipadamente
e os teus olhos ignoram as letras e fixam as entrelinhas
e exclamas: "mas afinal... estas palavras são minhas!"
O caminho para trás está vedado e tens um muro a tua frente
quando olhas para os lados vês a mobília indiferente
e abandonas essa casa onde sentiste o chão a fugir
arquitectas outra morada, mas sabes que estas a mentir.
Porque há qualquer coisa que não bate certo
qualquer coisa que deixaste para trás em aberto
qualquer coisa que te impede de te veres ao espelho nu
e não podes deixar de sentir que o culpado és tu

(Jorge Palma)

19 fevereiro 2010

As salaam alaykum


Se a ti, senhor, venho com todo o respeito, seguramente a questão não é o medo.
Onde acabam os teus começam os meus direitos, não os subestimes que eu também tenho um ego. Olhas para mim com iniquidade… Tem cabimento alguém ignorar a minha existência?
Senhor dos ismos deixa lá isso: não é actual, o teu mundo foi ontem. Tu estás perdido, não faz sentido desrespeitar a liberdade do homem
Não reina a paz onde não houver justiça
Não reina a paz onde os homens não são iguais
Não há sossego enquanto houver rejeição
É chegado o momento de agir com prudência
É chegado o momento de encontrar uma solução
Analisem, opressão não prospera
Analisem, imposição não coopera

(a partir de “Senhor dos ismos”, de Prince Wadada, in Natty Congo)

05 janeiro 2010

NOBODY'S BIZNESS no Maxime


“There ain't nothing I can do, or nothing I can say,
Some folks will criticize me.
So I'm gonna do just what I want to anyway,
And don't care if you all despise me.
If I should take a notion
To jump into the ocean,
It ain't nobody's business if I do.”

(Billie Holiday / Nobody's Business)